Quem é Reza Pahlavi, príncipe herdeiro do xá do Irã que se coloca nos EUA como alternativa ao regime islâmico do país?
Nomeado príncipe herdeiro em 1967, durante a coroação de seu pai, ele vive no exílio e pede pela renúncia do aiatolá Ali Khamenei. Reza Pahlavi estava destinado a governar o Irã, mas faz quase meio século que ele não vive lá. Agora, com a atual tensão entre Irã, Estados Unidos e Israel, ele voltou a aparecer, apresentando-se como uma alternativa caso haja uma mudança de regime.
Nascido em Teerã, é o filho mais velho do último líder da dinastia Pahlavi, o xá (rei) Mohamed Reza Pahlavi, que governou o país com o respaldo dos Estados Unidos de 1941 até 1979, quando foi derrubado pela Revolução Islâmica, que atualmente governa o Irã.
Desde então, Pahlavi, o herdeiro, se tornou um dos críticos mais conhecidos do líder supremo iraniano, o aiatolá Ali Khamenei, que está no poder desde 1989.
Durante a atual crise causada pela guerra entre Israel e Irã, além dos ataques dos EUA às instalações nucleares iranianas, Pahlavi afirmou que esta é uma oportunidade única para avançar com uma "mudança de regime" em Teerã.
Ele considera que a República Islâmica está em sua posição mais fraca depois dos ataques sofridos, e que essa é uma "oportunidade sem precedentes" para derrotar Khamenei.
"A raiz do problema é o regime e sua natureza. A única solução é que esse regime deixe de existir", disse à BBC no domingo (22/06) durante uma entrevista em sua casa, em um subúrbio perto de Washington, nos EUA.
"A República Islâmica está desmoronando", reiterou na segunda-feira (23/06) durante uma coletiva de imprensa que compartilhou em suas redes sociais.
Para Pahlavi, o "culpado" do momento atual que vive o Irã é Khamenei "e sua facção corrupta e destrutiva", a quem ele exige a renúncia do cargo.
Pahlavi fez um apelo às forças armadas iranianas, aos membros do exército e da polícia para que se afastem do regime e "se unam ao povo" para combater a enfraquecida República Islâmica.
Ele deixou claro que não busca restaurar a monarquia, mas quer um Irã "secular e democrático", pelo qual se oferece a ter um papel simbólico dentro da comunidade iraniana no exterior.
"Me apresento para liderar essa transição nacional, não por interesse pessoal, e sim como servidor do povo iraniano", afirmou.
"Não se trata de restaurar o passado. Trata-se de assegurar um futuro democrático para todos os iranianos."
Mas, quem é Pahlavi?
De príncipe herdeiro a exiliado
Reza Pahlavi tinha apenas 7 anos quando, em 1967, participou da cerimônia em que seu pai, Mohamed Reza Pahlavi, recebeu o título de "rei dos reis", reforçando sua posição de liderança.
Ainda criança, sentado à esquerda do pai, foi nomeado oficialmente como príncipe herdeiro do Irã.
Nascido em 31 de outubro de 1960, Reza Pahlavi foi educado em um colégio particular localizado dentro do Palácio Real, e reservado exclusivamente para membros da família do xá.
Na juventude, estudou aviação e se formou como piloto de combate. Em 1978, com 17 anos, viajou aos Estados Unidos para continuar seu treinamento militar em aviação no Texas.
Mas, antes que pudesse voltar ao serviço, a Revolução Islâmica derrubou o regime de seu pai.
Diante de uma onda de protestos no Irã, o xá foi obrigado a abandonar o país em janeiro de 1979. Mohamed Reza Pahlavi saiu com sua família rumo ao Egito, logo depois para o Marrocos, Bahamas e México, antes de chegar aos Estados Unidos, onde recebeu tratamento médico para um câncer.
A repentina perda de poder deixou o jovem príncipe herdeiro e sua família apátridas, dependendo de um círculo cada vez mais reduzido de simpatizantes da monarquia no exílio.
Nas décadas seguintes, a tragédia atingiu a família em mais de uma ocasião. Sua irmã e seu irmão mais novos tiraram a própria vida, deixando Reza como líder simbólico de uma dinastia que muitos já consideravam parte do passado.
Em julho de 1980, o xá morreu de câncer.
Desde então, Pahlavi vive nos Estados Unidos. Estudou Ciências Políticas, se casou com Yasmine, uma advogada irano-americana, e teve três filhas: Noor, Iman e Farah.
Mas, como caiu o reino que supostamente iria herdar?
De xá à aiatolá no Irã
Mohamed Reza Pahlavi reinou como monarca do Irã durante 37 anos.
Nesse período, o país experimentou um processo de ocidentalização e crescimento econômico, enquanto buscava recuperar o orgulho nacional e a história pré-islâmica do Irã, segundo descreve o jornalista Ali Hamedani, do serviço persa da BBC.
Na década de 1960, as mulheres conquistaram o direito ao voto e passaram a ter direitos relativamente semelhantes aos dos homens, mas, ao mesmo tempo, o xá enfrentava duras críticas pelo seu estilo autocrático e pela falta de democracia.
Muitos se recordam da era Pahlavi como uma época de rápida modernização e vínculos mais estreitos com o Ocidente. Outros, no entanto, se lembram de uma época marcada pela censura e pela temida polícia secreta Savak, o serviço de inteligência e segurança interna do Irã entre 1957 e 1979.
O clero muçulmano xiita acusava o xá de ir contra os valores islâmicos, enquanto os grupos de esquerda, influenciados pela extinta União Soviética, pediam por mais igualdade dentro do país.
Até meados de 1978, poucos podiam imaginar uma revolução capaz de transformar profundamente o Irã.
Mas, em poucos meses, os protestos envolveram intelectuais de esquerda, nacionalistas, secularistas e islamistas, no que ficou conhecido como a Revolução Iraniana de 1979.
Ao longo de 1978, os manifestantes contrários ao xá passaram a expressar, cada vez mais fortemente, suas reivindicações em termos religiosos. Até que, no final daquele ano, a retórica islamista começou a ganhar força nas ruas.
Nesse contexto, o aiatolá Ruhollah Khomeini voltou ao Irã depois de 14 anos de exílio no Iraque e na França por se opor ao regime, posicionando-se como o único capaz de unificar as diversas correntes em torno de um eventual governo islâmico.
A Revolução Iraniana terminou com a queda da monarquia e abriu espaço para a inauguração da atual República Islâmica.
Os EUA haviam sido um aliado indiscutível do xá. Por isso, em novembro de 1979, um grupo de estudantes e militantes islamistas, contrários à monarquia, tomou a Embaixada dos EUA em Teerã em apoio à Revolução Iraniana e manteve reféns cerca de 50 americanos durante 444 dias.
Dez anos depois, em 1989, o aiatolá Khomeini morreu, e o então presidente do Irã, Ali Khamenei, foi designado como novo líder supremo.
Khamenei, a quem Reza Pahlavi questiona, governa o país desde então, e cumpre o papel de chefe de Estado, além de controlar o Corpo da Guarda Revolucionária Islâmica, entre outras funções.
A política desde o exílio
Após seu pai ter sido derrubado, Reza Pahlavi abandonou o treinamento no Texas e se reuniu com sua família no Cairo em março de 1980.
Em 31 de outubro do mesmo ano, meses depois da morte do xá, Reza Pahlavi, que tinha 20 anos, se declarou como o novo rei do Irã, chamando a si mesmo de "Reza Xá 2º". Do exílio, ele afirmou que era o herdeiro legítimo do trono da dinastia Pahlavi.
No entanto, o governo dos Estados Unidos anunciou que não o apoiava.
Era 1980, último ano da presidência do democrata Jimmy Carter, que estava na Casa Branca desde 1977, e o ano em que o republicano Ronald Reagan ganhou as eleições em novembro.
Em março de 1981, por ocasião do Ano Novo persa, Pahlavi fez uma declaração pedindo a todos os opositores do governo iraniano que se unissem, e lançou um chamado para "a resistência nacional".
A partir desse momento, ele se manteve ativo na política do exílio, confiando em seu legado familiar, redes de apoio na Europa e nos Estados Unidos, além do respaldo de algumas correntes iranianas que se opõem ao sistema islâmico.
Depois de viver por vários anos no Egito e no Marrocos, Reza Pahalvi se mudou, em 1984, para Maryland, nos Estados Unidos, e fixou residência em um subúrbio da capital americana, onde ainda vive com a esposa.
Pahlavi afirma que o Irã deve ser um estado democrático e secular, e que a religião deve ser separada do Estado.
"Acredito que o Irã deveria ser uma democracia parlamentar secular, e o povo decidir a forma final do Estado", disse em 2018, durante uma conferência no The Washington Institute for Near East Policy, onde pediu apoio aos iranianos que tentam substituir o regime atual por uma democracia secular.
Em fevereiro de 2023, Pahlavi falou ao jornal britânico Daily Telegraph e reiterou que a decisão sobre qual forma de governo o Irã deveria adotar diante de uma eventual queda do aiatolá Khamenei, cabe ao povo iraniano, e que ele não pretende se candidatar a nenhum cargo político.
Em março de 2023, ele enfatizou que o secularismo é necessário para a democracia e defendeu meios não violentos para derrubar o governo iraniano.
Pouco depois, Reza Pahlavi e sua esposa, Yasmine, visitaram Israel em uma tentativa de reconstruir as relações históricas entre Irã e Israel. Ali, ele visitou o Muro das Lamentações e o Museu Yad Vashem (museu do Holocausto), e se reuniu com o presidente israelense Isaac Herzog e com o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu.
'Momento muro de Berlim'
Após os bombardeios de Israel ao Irã e o ataque dos Estados Unidos às suas instalações nucleares, Pahlavi acredita que o momento político para pôr fim ao sistema de governo da República Islâmica está se aproximando.
"Este é o nosso momento Muro de Berlim", disse em um comunicado que compartilhou nas redes sociais.
Em declaração à imprensa, afirmou que o que parecia impossível há cinco anos agora é possível, citando como exemplo o colapso inesperado da União Soviética, que aconteceu em poucos dias.
Os Estados Unidos, contudo, negam estar por trás de um possível plano para mudança de governo no Irã, apesar de o presidente Donald Trump ter mencionado isso em uma mensagem nas redes sociais.
Pahlavi enfatiza que já existem planos prontos para transformar o Irã em um sistema democrático, caso o aiatolá Khamenei caia.
Para o herdeiro do xá, a crise econômica e política que o país vive, além da pressão internacional e o crescente isolamento, fazem com que o regime se encontre em uma situação frágil e instável.
Nas últimas quatro décadas, Pahlavi tem tentado se apresentar como uma terceira via entre o regime da República Islâmica e o caos ou golpes militares. No entanto, ele enfrenta grandes desafios.
Entre eles, a ausência de uma base popular real dentro do Irã e as profundas divisões entre as correntes de oposição no exterior.
Além disso, a imagem negativa associada ao governo de seu pai — devido às violações de direitos humanos e o domínio do aparato de segurança — ainda pesa contra ele.
Vários analistas acreditam que sua aproximação com Israel pode levá-lo a perder apoio popular dentro do país, especialmente entre grupos conservadores ou nacionalistas que veem Israel como um inimigo estratégico.
Outras correntes da oposição iraniana rejeitam a ideia de que Pahlavi recupere o poder ou até mesmo que lidere uma transição, destacando que lhe falta carisma político e capacidade para liderar uma ampla aliança.
Por outro lado, seus apoiadores entendem que sua imagem moderada, seus vínculos com o exterior e seus antecedentes seculares o colocam em uma posição favorável para liderar uma eventual transição para um novo governo, evitando, assim, cenários sangrentos como nas transições de países como Síria, Líbia e Iraque.
Com informações de Waleed Badran, do serviço persa e do serviço árabe da BBC.
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